Fala, pessoal, sejam bem-vindos ao texto #4 da newsletter “dudu escreve”. É sempre um prazer ter vocês por aqui.
Dicas da edição #4:
Dica musical: minha playlist de julho do Spotify. Tem de tudo, não se assuste.
Dica literária: livros de três autores que cito no texto de hoje.
Histórias sem data de Machado de Assis. Está disponível gratuitamente neste link.
Oito contos de amor de Lygia Fagundes Telles.
Paris é uma festa de Ernest Hemingway.
Dedicatória
Dedico o texto de hoje a todos os meus leitores, que, apesar de ainda serem poucos (será?), são muito valiosos.
Sem mais delongas, vamos ao texto!
Sobre processos criativos, insignificância e liberdade
Se tem uma frase de senso comum em que realmente acredito é que os grandes escritores leem muito. Mas como “muito” é bem relativo já que a mensuração pode ser feita por tempo, quantidade de livros, páginas, variedade de estilos ou qualquer outra métrica aleatória, talvez não seja “muito” na minha ou na sua concepção, mas confio que provavelmente é bem mais que o “nosso” bastante.
Um dia estava pensando nisso enquanto andava de bicicleta e dei uma viajada me questionando se Machado de Assis lia mais ou menos que Hemingway. Se García Márquez era mais ou menos assíduo nas leituras que Clarice Lispector. E se a Lygia Fagundes Telles passava noites em claro devorando livros enquanto Walt Whitman dormia.
Nessa viagem acabei refletindo sobre as minhas andanças nas escritas e como cultivo o hábito da leitura no meu cotidiano. Eu amo ler, de verdade. Organizo e me programo nas leituras, uso caderninhos para anotar as boas frases e às vezes até escrevo textos em cima delas. Sempre estou lendo algo - às vezes 2 ou 3 ao mesmo tempo - mas juro que sinto que leio pouco. Talvez por ser meio devagar, não sei dizer. E talvez eu seja um escritor pior por causa disso, mas estou buscando melhorar.
É claro que sei que sou um verme nanico microscópico perto destes que citei e que ainda estou bem longe de ser um dos grandes. Mas se estou aqui escrevendo essa newsletter e colocando textos no mundo, é porque tenho a pretensão de ser lido por mais e mais pessoas e de que me reconheçam como escritor. E que entendam meus textos. Ou não. Mas que leiam. A Lygia Fagundes que dizia que não esperava ser compreendida, mas ser lida, porque, afinal, ninguém entende ninguém. Achei ótimo isso.
Mas acho que o motivo de a minha leitura ser pouca (ou lenta) é justamente a minha mania de ficar relendo, sublinhando e anotando as partes que eu gosto dos textos.
Das coisas que destaco, a principal é quando os autores resolvem falar sobre os seus processos criativos ou da própria escrita durante o texto. Um dos reis disso é Machado. Perceba quando pegar algo dele para ler. Eu li no prefácio de um de seus livros que isso se chama “autoconsciência narrativa”, um recurso literário e não um mero vício estilístico, que é usado com maestria por lendas como Machado.
Como exemplo, cito a primeira página do último livro de sua autoria que li, chamado “Histórias sem data”: Machado, antes mesmo de começar a obra, faz uma “advertência” aos leitores para explicar o título da obra e criticar a própria escolha por assim fazer: “penso que o título está explicado. E é o pior que lhe pode acontecer, pois o melhor dos títulos é ainda aquele que não precisa de explicação.”
Neste mesmo livro, no meio de um dos contos, Machado interrompe o que está falando para assumir que se arrependeu de ter começado a contar a história naquela ordem, afirma que vai começá-la sob outra perspectiva, fazendo com que o leitor “volte a um novo início”, sem que o dito até então seja descartado, apesar de ao leitor parecer que o está fazendo. Eu, particularmente, acho genial a forma como ele utiliza esse recurso.
Hemingway, outro autor que gosto demais, fala muito no meio dos seus textos sobre processos criativos e de técnicas para tornar a sua escrita melhor. Uma delas é brincar com as omissões, que ele diz que são bem aplicadas desde que você saiba o motivo dela estar sendo utilizada e que a parte omitida reforce a narrativa para que os leitores sintam alguma coisa além daquilo que entenderam.
Também acho sensacional sua ideia de não pensar mais no que está escrevendo até a hora de voltar à labuta literária no dia seguinte para “deixar o subconsciente trabalhar”, assim como destaca a importância de ouvir outras pessoas falarem sobre coisas banais e seus assuntos pessoais, de perceber o mundo a sua volta e ler outros livros. A ideia é não ficar obcecado com seu próprio trabalho e acabar ficando impotente para executá-lo.
E por aí vai. Tem muitos autores que gostam de utilizar esse recurso, e eu realmente perco um tempo considerável refletindo sobre as escolhas literárias dos autores durante as minhas leituras, até quando o autor não fala nada sobre, muito porque almejo entendê-los para aprimorar os meus processos e aguçar meus sentidos, visando refinar a minha escrita.
Como tenho a consciência plena de que preciso melhorá-la e que ela não está nem perto de ser uma ótima escrita, fico sempre meio nervoso antes de publicar qualquer texto e acabo acumulando inseguranças, principalmente a respeito da minha evolução. No entanto, apesar do nervosismo, confesso que existe uma liberdade muito reconfortante em estar neste capítulo embrionário da minha vida de escritor, visto que ainda sou aquele verme nanico microscópico que citei e, por isso, bastante insignificante para a cena literária.
Entendam, não estou me desmerecendo, só estou falando obviedades. Eu não tenho contrato com nenhuma editora, não ganho um centavo com as escritas nem tenho acordos formais a cumprir além deste lindo e inestimável compromisso que firmei comigo mesmo e com vocês, meus valiosos leitores. É essa liberdade que me desvencilha de amarras como ter que seguir alguma fórmula “viralizável”, escrever apenas sobre um tema ou evitar certos assuntos para não desagradar alguma “massa” que “consome” os meus escritos.
Um dia, devaneando sobre essa liberdade que sinto, fiquei me perguntando de onde veio, lá no início, a minha vontade de escrever. O subtítulo desta newsletter fala que “tenho muito a dizer” e quem me conhece pessoalmente sabe que é verdade na maioria das vezes. Eu até me controlo.
Talvez venha justamente daí. Do que deixo de falar. Da falta de liberdade para ser 100% eu. Principalmente nos momentos que tive ou tenho que me segurar, porque, no final das contas, a vida é uma grande e eterna performance.
É para poder me sentir e ser livre que escrevo, ainda que apenas por alguns momentos. E, é claro, para ser lido também. Afinal, todo texto clama por um leitor. Ou quase todos. E por isso fico muito feliz por ter alguém usando seu tempo precioso para ler a minha manifestação de liberdade.
Porque os textos não são o papel impresso, o Instagram ou esta plataforma, esses são apenas canais. O texto é o sentimento organizado em palavras que sai de quem escreve e fica marcado em quem lê. Em vocês, leitores, a quem agradeço por estarem aqui.
E esse foi o texto #4!
Nos vemos no dia 10/08, na edição #5 desta série, sempre às 10h, na sua caixa de entrada!
Muito obrigado pela leitura!
Gostou do texto? Curta, comente e compartilhe com alguém que pode gostar de dudu escreve.
Muito bom o texto!!
Parabéns! Admiro muito vc!! 💖
“talvez venha justamente daí. do que deixo de falar”. nada mais profundo do que essa consciência, nem mais vivo do que mergulhar em tudo aquilo do invisível não dito e trazê-lo à superfície luminosa das palavras. uma vez, escrevi a minha irmã sobre porque chorava ao escrever cartas. é esse poderoso não dito, que a gente tira das entranhas da alma, que guardam os nossos maiores tesouros escondidos, que tem a força de mover todo o amor, a dor e a lágrima.